Mesmo não sendo próximo ou amigo de Raul Ramos, eu, como profissional de arquitetura e como alguém que leva a sério o ato de pensar, escrever e criticar Arquitetura, alguém que planeja fazer disso uma atuação constante e bem-sucedida em sua vida profissional, não poderia deixar de manifestar meus pêsames por essa perda e tentar escrever algumas linhas sobre ela, o que ela significa pra mim e o que deveria significar para a comunidade de arquitetos locais.
Quando iniciei o curso de arquitetura não demorou muito pra começar a buscar "meus heróis", sim, aqueles que fazem a Boa Arquitetura e de certa forma servem de exemplo aos mais novos. Falávamos da Síntese. Falávamos de Raul (embora nosso círculo sempre falasse mais dos arquitetos europeus).
Lembro que na época a Síntese era a única empresa de arquitetura que eu respeitava. Tinha mesmo vontade de trabalhar lá. Por quê? Simples, porque lá se fazia a tal da Boa Arquitetura, não uma arquitetura genial ainda, mas uma arquitetura que, inteligentemente, se libertou dos antigos (e ainda atuais) modelos de edificação vertical, baseados em caixas de sapatos (que alguns colegas chamam vulgarmente de "feijão-com-arroz")
A Síntese praticava a ousadia. E a ousadia é o estopim para Arquitetura Genial! E afirmo seguramente mais: O Raul conseguiu arrastar toda a arquitetura de edificação vertical em sua direção. Uns passaram mesmo a copiá-lo cinicamente. Outros, a negá-lo descarada e publicamente (lembro uma propaganda de uma construtora local que dizia: "Nosso nome não é uma 'Síntese'. Temos nome e sobre-nome!"). Resumindo, a arquitetura da Síntese, por conseguinte, de Raul Ramos, mudou o panorama da nossa produção local. Principalmente na área de edificação vertical.
Sendo Raul um arquiteto da nova geração e ainda muito novo (48 anos), perdemos um dos arquitetos que, com toda certeza, iria amadurecer mais e nos ajudar a recuperar o nosso passado rico em estética. Não que isso seja próprio de um "messias arquitetural", mas em talentos jovens, o processo de amadurecimento e consolidação de um estilo e estética conceitual é um processo natural, afinal, quem tem inteligência e genialidade, cresce com elas.
Lembro mais: de não ter visto um outdoor com o Raul a receber um prêmio ou mensão empresarial (que com certeza ele deve ter recebido). Porém, ja ví inúmeros arquitetos com trabalhos muito fracos (que passam até despercebidos) recebendo premiações de "revelações" e "arquitetos do ano" e semblantes cínicos estampados em outdoors pela cidade.
Alias, falando nisso, eu dificilmente vejo arquitetos que merecem esses prêmios os recebendo... Vejo até garotos que desmamaram ontem mencionados como "revelações empresariais do ano" em arquitetura, mas um Aurélio Meira, um Coelho Bassalo ou um Herlom Oliveira, dificilmente se vê. Isso prova que há algo de errado nesse meio que "promove" a "arquitetura" local. Quem é bom deve ser bom e aparecer o ano inteiro, e não somente de forma sazonal em premiações questionáveis! E Raul era um desses que deveria aparecer sempre, seja com trabalhos, seja com publicações.
Lamento por essa perda. Lamento verdadeira e profundamente.
Espero que os que aí ainda se encontrem, façam arquitetura não somente com seriedade. Mas, também, com filosofia, arte e ousadia!
Absorvamos esses legados caros amigos e leitores! Coloquemo-os na nossa história edificada e realizemos também a boa e genial Arquitetura.
Descansa em Paz Raul.
Que estejas ao lado de Deus em sua obra arquitetônica no universo.
Kostas, 29 de Dezembro de 2008